terça-feira, 23 de outubro de 2012

Percepção e consciência - "O Templo dos Homens"



Caminhou rápido, diminuindo os passos conforme aproximava-se do local onde o velho habitava. Conhecia o terreno, não desejava que o Sadhu percebesse a sua presença, movia-se silencioso, como se pisasse algodão, viu o sábio em posição de Lotus vinte centímetros acima do solo com uma auréola de luz em seu torno. Mal olhou, a imagem desapareceu, uma mão gelada segurou-lhe no ombro e uma voz soou:

- Onde está o mestre?
- Não sei…- Gemendo de medo sem reconhecer a voz.
- Onde está o corpo?
- Não sei…- Repetiu gemendo e tremendo.

Olhou para trás, a noite estava negra, a abóbada celeste havia escurecido como breu, nem os contornos das árvores percebia, o pânico apoderou-se do seu corpo, começou a chorar como uma criança enquanto uma mão gelada afagava-lhe o rosto e uma voz dizia:

- O mestre sou eu, o teu corpo está aqui, mas a mente saiu do corpo. Vieste a este lugar para descobrir se eu dormia? Olha em frente e vê!

Abhay virou o rosto e viu o Sadhu de novo pairando no ar rodeado pela estranha luz.
A voz repetiu, calma e serena:

- Onde está o mestre?..Naquele corpo que ali vêz ou na tua consciência?
- Não entendo !... - Abhay continuava a tremer.
- O quê não entendes? - Soou uma voz gutural

- Porque o Sadhu não é meu mestre, mas sim a minha consciência...A voz encheu-se na noite ainda mais forte:

- Porque o verdadeiro mestre do corpo é a consciência. Se não seguires os ensinamentos do Sadhu, estes de nada te servirão na vida, por isso o mestre é a tua consciência e não ele!

- Por que a tua voz está diferente?
- Como podes reconhecer a voz do homem que segues se habitas um corpo sem consciência?

Sem percepcionar, a voz do Sadhu tornou-se real, Abhay entendeu que o corpo parara de tremer. Agora reconhecia as tonalidades e o timbre dos sons que saíam dos lábios do velho sábio.

- Reconheço a tua voz..
- Sim, porque a consciência se desligou do teu corpo pelo medo e só agora voltou.
- Sim, tive medo Sadhu!
- Tiveste medo porque ignoraste-te a ti próprio, senti caminhares, os teus passos, desde que saíste de casa.
- Vim ver se dormias Sadhu.
- Não, eu nunca durmo, o que vês ali?
- Vejo-te Babu, o teu corpo pairando acima da terra.
- Não, o que vez não é o meu corpo mas a imagem que a consciência transmitiu, o meu corpo está atrás de ti.

Abhay virou-se de novo para trás e viu o Sadhu envolto no seu pano de cor de açafrão, olhou para a frente e viu o sábio de novo levitando no ar em posição de asana.

- Qual deles sois vós senhor?
- Eu sou o que nunca dorme!

A noite ficou clara de novo, a imagem desapareceu e a voz silenciou. Sentiu a folhagem verde da figueira agitar-se com um sopro de vento forte, o silêncio caía sem que o pudesse ver, apenas o sussurro das folhas da velha árvore secular.

(IN " O TEMPLO DOS HOMENS")

Miguel Martins de Menezes

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