quinta-feira, 25 de outubro de 2012

"Corpo de Mulher"


"Os mercadores de beleza"


Existem muitas mensagens que chegam até nós com uma imagem de perfeita beleza do amor. Muitos escreveram sobre esse sentimento nobre, o mais poderoso que um ser humano possui, mas não tiveram o cuidado de o ligar à realidade destruindo pessoas com a beleza das palavras.

Escrever sobre sentimentos é perigoso, pode danificar a consciência humana a um ponto que esta começa a olhar o amor como algo que não tem dentro de sua casa, no seu marido ou na sua esposa, pois esta informação destorcida leva a olhar o ente que amamos de outro modo, associando a realidade à utopia, começamos a dizer: este não é o homem que eu amo ou esta não é a mulher dos meus sonhos…

Tudo isto porque não reconhecemos as nossas imperfeições e projectamos nessas belas palavras de escritores conhecidos sentimentos que desnutrem os nossos afectos e a concepção de amar, agora padronizada por mentes esclarecidas que o usam sem vontade de mudar a sociedade, mas sim de mostrar imagens que não vivem no colectivo humano e na realidade limitada de cada família.

Quando recebemos aqueles arquivos de mensagens belas de amor, esquecemos de olhar um outro lado: que são apenas mensagens da utopia do amor de pseudo-iluminados que nem querem ver o lado humano, transmitindo uma mensagem errada desse sentimento nobre e maravilhoso. O mais nobre que o ser humano possui!

Por essa razão critico esses escritores, pois são apenas meros vendedores de uma beleza que existe na acepção utópica da sua visão. O escritor deve ter em mente sobretudo que a mensagem de amor deve estar ligada à consciência da nossa existência e não destruir com beleza o que as pessoas, dentro das suas limitações, têm na sua frente, a sua família e os seus companheiros de vida, obrigando estas (pessoas) a olhar o ente querido com uma visão destruidora da realidade apenas com o mero objectivo de transmitir beleza.

Na verdade temos que meditar e perguntar a nós próprios porque razões as pessoas confundem amor com prazer, felicidade com posse de bens materiais e sobretudo reflectir sobre a nossa atitude imediatista de desejar tudo agora, Já!

Vivemos numa sociedade que confunde elementos de modo a permitir associações erradas a sentimentos. O amor não é um sentimento absoluto de quem se projecta numa exigência ética e axiológica total…, o ser humano não possui esse poder, o que esses poetas e escritores dizem destrói os fundamentos da nossa consciência e dos nossos erros com uma violência tão grande que esta pode afectar a família no seu todo e a sociedade como uma estrutura onde a família habita.

A maioria das pessoas associa hormonas gostosas a amor, tem faltado amor nas pessoas, não o amor ideal e penoso dessas mensagens belas que recebemos nos nossos emails, mas sim o amor verdadeiro, aquele que assume com humildade a nossa condição de seres limitados, mas que ao assumirmos, estamos a dar o primeiro passo para a percepção real desse sentimento nobre, cultivando com as pessoas com quem partilhamos a vida e dando a mão para mudarmos sem nos destruirmos com uma beleza fictícia, algo que não existe senão na mente dos vendedores de utopia.

Eu acredito que o amor é a solução para a enorme crise da consciência humana actual. Não chorem porque são infelizes, nem sorriam quando a luz entra nos vossos olhos até chegar ao coração. A verdade está algures no meio entre o choro e o sorriso, mas existe um facto que é muito mais importante que essas mensagens bonitas que nos chegam nos "PPS" da vida!..

Amor verdadeiro é comunicação, é na comunicação que se estrutura o afecto. Comunicação também são actos e atitudes, não apenas palavras, existe uma dimensão da comunicação que todos ignoramos e que eu aqui tentarei partilhar numa próxima mensagem; nós comunicamos também por ondas cerebrais, nós somos pura energia, quando cortamos a comunicação destruímos tudo e toda a possibilidade de amar e sermos amados, joguem no lixo essa falsa beleza da utopia e usem da maior humildade com as pessoas que amam respeitando-as sem olhar palavras que apenas existem na beleza dos ideais humanos mediatizados pelos mercadores de beleza.

O amor não é um sentimento que apenas existe para quem se projecta numa exigência ética e absoluta total, senão o amor não superaria o erro, os mercadores de beleza o dizem, mas conceptualmente estão errados, pois o amor é compaixão, o reconhecimento da nossa incapacidade, a pura humildade do reconhecimento do erro.

Nós somos pura energia!

Miguel Martins de Menezes

"Menina Madura"


"As palavras..."


" A nova ordem"


"O tempo dos Homens"





Abhay estava deslumbrado, mais tarde falaria ao seu discípulo que a energia sexual era a principal fonte do potencial espiritual, o fogo da paixão, os ascetas deveriam controlar e sublimar a sua luxúria, para não destruir o poder espiritual, sob pena deste tornar-se inexistente devido à perda energética do calor interno do corpo expelido durante o ato sexual, a maior fonte de energia espiritual.

O controlo absoluto do momento de entrega dependia de vários factores; a alimentação era rigorosamente determinada, controlada e adequada, certos alimentos anti-afrodisíacos não deviam ser tocados, poderiam levar vinte dias a atingir o clímax orgástico, protelando-o diariamente em cada momento até que o venerado dia chegava! É então que o maior prazer é atingido, a mulher venerada como uma Deusa, o encontro físico destinava-se a proporcionar-lhe tudo como se ela fosse sagrada. Nesse momento todas as energias são libertadas dos corpos até à completa exaustão, o mais completo estado de prostração, a plenitude absoluta…

Abhay recordou-se de Janalih, a memória permanente da mulher vinha ao seu encontro mais viva. Naquele preciso momento recordou o último confronto com a sua noiva, deixando de escutar o seu mestre. A sua mente viajou para longe, lembrando o modo como rolavam em cima da areia fina, sentindo a frescura da água dos seus lábios aveludados perfumados pelo néctar da vida que havia recebido tépido vindo do interior do corpo e das mucosas. Um cheiro adocicado ainda permanecia dentro das narinas, da boca e do cérebro, a sua pele ainda se fazia sentir nos dedos. Jamais esqueceria a ternura dos momentos de mãos dadas e a fragrância única da mulher a quem dedicou a sua vida. Ainda exalava o bálsamo do seu abraço, não havia distância que matasse esse sentimento divino que aproxima as pessoas. Era a sua noiva, a Deusa da sua adoração. 

Babu reparou que Abhay não o escutava mais, bastava o olhar perdido na distância do seu horizonte para o perceber, os sentidos ausentes do jovem revelavam-lhe onde este se encontrava, traiam-no… Sorriu interiormente sentindo-se culpado daquele silêncio repentino, intimamente perdoava-lhe esse voo mental para o coração da sua amada. Subitamente Abhay perguntou-lhe:

– Mestre, como pode aceitar-me como teu discípulo se eu vou casar?

– Uma vez perguntaste-me se eu era um Sadhu e eu respondi-te que não - Afirmou com serenidade -. Na verdade não o sou embora as pessoas me olhem como tal. Apenas tento transmitir-te conhecimentos sem a pretensão de que fiques eternamente do meu lado. 

– Como não és um Sadhu?

– Não, não sou um Sadhu digo-te pela terceira vez - O velho sábio olhou Abhay nos olhos com seriedade - Sou o que nunca dorme, não possuo nenhuma religião, não sigo nenhum Deus, não tenho nenhuma seita ou grupo, dedico a minha vida a tudo o que me rodeia, em breve saberás quem sou, o verdadeiro templo de Deus está dentro de nós...

– Desculpe mestre, mas se não é um Sadhu por que razão leva-me ao Khumba Mela*?

– O mais importante no Khumba Mela é a consciência da vida e da existência, por essa razão decidi partilhar esse momento contigo, contudo desejo dizer-te que deves olhar tudo atentamente e em silêncio, tentar abranger o seu alcance, mais do que intervir, ainda que possas e devas participar de tudo o que te rodeia.

– Quando Babu? Quando vou saber tudo isso?

– És persistente como o vento de uma tempestade, emotivo como o fogo que lambe a madeira, curioso como as águas que batem nas rochas porosas do oceano penetrando cada buraco ou fresta de modo inquisitivo. Tem paciência, breve significa que o tempo urge, não demora, o momento aproxima-se como os segundos que ocorrem entre a luz de um raio e o rombo sonoro de um trovão. Babu silenciou-se olhando Abhay nos olhos com um rosto muito sério.

– Ai Babu! – Abhay mostrava um rosto crispado – Provocas medo dentro de mim!

– Nunca sintas medo de nada na vida, apenas podes sentir medo de uma só coisa… 

– O quê Sadhu?

– De ti próprio… és o teu pior inimigo, és tu quem projecta emoções e liberta ou aprisiona a tua fonte de energia, os teus voos, as tuas capacidades e desejos, o calor e o apego a cada coisa na tua vida. – Entendo mestre. Sou eu quem comanda tudo?

– Sim. Tu és o leme do teu barco e o destino também, tu és os passos e o caminho, se acreditares no que fazes atingirás sempre os objectivos a que te propões, a tua fortuna, o teu rumo. A única coisa que ignoras é o tempo, pois este é uma consequência do modo como ages, o tempo não existe, apenas foi concebido para domínio dos humanos.

– Como assim?

– O tempo não para, é imutável, perene, não o vês, não o sentes, não o escutas, não o podes tocar, mas os teus atos determinam o teu tempo. Se deres um passo em frente no momento que um carro se aproxima morres… A rua está na tua frente e continuará a estar depois do carro passar. Não tenhas pressa, faz o mesmo com a tua vida, não a apresses, luta por tudo o que sonhas, nunca desistas de sonhar, mesmo que os sonhos estejam distantes, mesmo que os outros não acreditem neles, pois cada pequeno passo que dás te aproxima deles, isso é o tempo… 

– Porque se não caminhar em direcção aos meus sonhos, nunca vou conseguir?

– Exactamente, percebeste… esse é o tempo, não importa se levas trinta minutos ou uma hora, o que importa é chegar.

– Nunca tinha pensado nesse lado das coisas mestre…

– Não. Eu sei… O mais importante na vida não é a pressa com que consegues atingir objectivos, mas sim a firmeza da vontade. Não existe génio que não seja superado pelo trabalho e pela vontade, o ser humano é dotado de capacidades que desconhece e não utiliza, a sua beleza é inigualável. 

A madrugada surgia com a sua luz etérea, Abhay já havia observado esse fenómeno que lhe fazia lembrar a morte. Os contornos esbatidos das árvores, a neblina húmida cobrindo tudo como uma mortalha porosa. Uma visão fantasma da realidade que o dia trazia após o nascer dos primeiros raios de luz solar aquecerem o corpo, desfazendo esse manto que disfarça os perfis no momento em que as trevas abraçam a luz da vida.

Nota do autor: Khumba Mela* - Festival de homens santos realizado na Índia de 12 em 12 anos. Consiste numa peregrinação de todo o planeta cuja última manifestação reuniu 60 milhões de pessoas em Haridwar, no sopé dos Himalaias. O festival é organizado pelo governo indiano que para o efeito constrói uma autêntica cidade de tendas.


Extracto de "O Templo dos Homens"
Miguel Martins de Menezes 

"Brisa Matinal"






"Viagem sem regresso"


terça-feira, 23 de outubro de 2012

Miguel Marins de Menezes / Pensamento


" APRISIONEIRA " - Poema


Percepção e consciência - "O Templo dos Homens"



Caminhou rápido, diminuindo os passos conforme aproximava-se do local onde o velho habitava. Conhecia o terreno, não desejava que o Sadhu percebesse a sua presença, movia-se silencioso, como se pisasse algodão, viu o sábio em posição de Lotus vinte centímetros acima do solo com uma auréola de luz em seu torno. Mal olhou, a imagem desapareceu, uma mão gelada segurou-lhe no ombro e uma voz soou:

- Onde está o mestre?
- Não sei…- Gemendo de medo sem reconhecer a voz.
- Onde está o corpo?
- Não sei…- Repetiu gemendo e tremendo.

Olhou para trás, a noite estava negra, a abóbada celeste havia escurecido como breu, nem os contornos das árvores percebia, o pânico apoderou-se do seu corpo, começou a chorar como uma criança enquanto uma mão gelada afagava-lhe o rosto e uma voz dizia:

- O mestre sou eu, o teu corpo está aqui, mas a mente saiu do corpo. Vieste a este lugar para descobrir se eu dormia? Olha em frente e vê!

Abhay virou o rosto e viu o Sadhu de novo pairando no ar rodeado pela estranha luz.
A voz repetiu, calma e serena:

- Onde está o mestre?..Naquele corpo que ali vêz ou na tua consciência?
- Não entendo !... - Abhay continuava a tremer.
- O quê não entendes? - Soou uma voz gutural

- Porque o Sadhu não é meu mestre, mas sim a minha consciência...A voz encheu-se na noite ainda mais forte:

- Porque o verdadeiro mestre do corpo é a consciência. Se não seguires os ensinamentos do Sadhu, estes de nada te servirão na vida, por isso o mestre é a tua consciência e não ele!

- Por que a tua voz está diferente?
- Como podes reconhecer a voz do homem que segues se habitas um corpo sem consciência?

Sem percepcionar, a voz do Sadhu tornou-se real, Abhay entendeu que o corpo parara de tremer. Agora reconhecia as tonalidades e o timbre dos sons que saíam dos lábios do velho sábio.

- Reconheço a tua voz..
- Sim, porque a consciência se desligou do teu corpo pelo medo e só agora voltou.
- Sim, tive medo Sadhu!
- Tiveste medo porque ignoraste-te a ti próprio, senti caminhares, os teus passos, desde que saíste de casa.
- Vim ver se dormias Sadhu.
- Não, eu nunca durmo, o que vês ali?
- Vejo-te Babu, o teu corpo pairando acima da terra.
- Não, o que vez não é o meu corpo mas a imagem que a consciência transmitiu, o meu corpo está atrás de ti.

Abhay virou-se de novo para trás e viu o Sadhu envolto no seu pano de cor de açafrão, olhou para a frente e viu o sábio de novo levitando no ar em posição de asana.

- Qual deles sois vós senhor?
- Eu sou o que nunca dorme!

A noite ficou clara de novo, a imagem desapareceu e a voz silenciou. Sentiu a folhagem verde da figueira agitar-se com um sopro de vento forte, o silêncio caía sem que o pudesse ver, apenas o sussurro das folhas da velha árvore secular.

(IN " O TEMPLO DOS HOMENS")

Miguel Martins de Menezes

"Amor de Mulher Madura" - Poema


sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Literatura, escrita e literacia



Ninguém pode escrever sem que haja plenitude, um cérebro liberto de constrangimentos e tumultos do dia-a-dia, a escrita é sobretudo um estado de consciência profundo. Tudo o mais que a rodeia são apenas elementares ferramentas utilizadas para a sua consumação num acto ou esforço de libertação.

O limite de um escritor pode ir até à loucura mais recôndita da imaginação humana; escrever sobre as deambulações amorosas de um gafanhoto arrogante. Contudo, a escrita deve ser sempre transportada das experiências que a realidade nos vai transmitindo, sobretudo com humildade, quando se escreve sem humildade destrói-se a clareza conceptual que pretendemos transmitir numa folha de papel e a mensagem torna-se inútil, pois não chega ao seu destinatário e apenas serviu para alimentar o ego do seu autor.

No decurso dos últimos anos temos assistido a um fenómeno de compressão da linguagem, a modernidade e o minimalismo tem comprimido maciçamente a linguagem destruindo-a completamente. Não é por acaso que alguns escritores fizeram uso deste recurso para se tornarem visíveis, violando as mais elementares regras da sintaxe em forma de apelo para "um novo modo de escrever" ou, como disse muitas vezes, marketing literário desonesto, criando textos sem a mínima estruturação. Umas vezes por pura ignorância das regras, outras como um modo de se mostrarem...Não é por acaso que vivemos num século de iletrados, que aplaudiu esta atitude, não os que não sabem ler, mas que não possuem consciência do objecto da leitura e da mensagem que esta passa.

Saber ler não é suficiente, é preciso compreender, saber usar a informação escrita contida nos livros, muitas vezes limitada pelo contexto familiar, social e escolar em que as pessoas vivem e crescem. Iletrado não é apenas aquele que não compreende o que lê, mas um conceito mais abrangente, pois a capacidade de inteligibilidade humana, por muito absurdo que pareça, está também ligada aos números e grande parte das pessoas não consegue fazer cálculos simples...Por essa razão, existem três grandes grupos de literacia: literacia de leitura, matemática e ciências (a sintaxe é uma das ciências mais antigas).

Este novo tipo de analfabetismo afecta a população que, apesar do aumento das taxas e dos anos de escolaridade, evidencia completa incapacidade do domínio da leitura, da escrita e do cálculo, vendo por isso, diminuída a capacidade de participação e intervenção na vida social. Trata-se de um analfabetismo funcional de aprendizagem limitada, mal sedimentada, insuficiente! Daí a importância dos Professores nos primeiros quatro anos de escolaridade; estes são mais importantes do que um professor universitário, um médico ou um general.

A literacia vai para além da mera compreensão e descodificação de um texto, é também a inclusão de um conjunto de capacidades de processamento de informação que os adultos usam na resolução de tarefas associadas com o trabalho, na vida pessoal e também nos contextos sociais (os governantes corruptos sabem disso). Por esta razão não basta ler, é necessária toda uma estruturação do crescimento humano "ab initio" para que a leitura se torne compreensível.

Um bom escritor precisa dominar um vocabulário extenso para atingir a sonoridade pretendida (muitas vezes duas palavras com o mesmo significado atribuem uma beleza sonora diversificada no contexto onde estão inseridas). Um bom dicionário ajuda, mas estes não transmitem a eloquência sonora na construção sintática de um agregado de palavras, apenas o significado de cada palavra isolada.

Hábitos de leitura consistente permitem uma rápida inserção da sonoridade da palavra no acto imediato da concepção estrutural do período. O dicionário ajuda, mas também delimita o escritor, o seu recurso deveria ser apenas funcional e não a fonte onde a escolha da palavra é determinada. Existe uma enorme diferença entre a palavra "escritor" (aquele que escreve) e o "ser escritor" ( aquele que projecta o Ser na escrita) são duas palavras, não basta saber escrever, dominar a sintaxe, gramática e prontuários ortográficos da língua.

"Ser Escritor" é também e sobretudo um estado de consciência; como Ernest Hemingway dizia: "Ninguém pode escrever sobre aquilo que nunca viveu", nem mesmo ficção (o acréscimo é da minha autoria), nem com cursos de escrita criativa, universidades ou outros recursos hoje utilizados como a chamada "parceria" na escrita...
Hoje Ignora-se a disposição das palavras nas frases, das frases no discurso, incluindo a sua relação lógica entre as múltiplas combinações possíveis para transmitir um significado completo e compreensível, a mais completa inobservância das regras de sintaxe A capacidade criativa do escritor fica reduzida, a sua visão pessoal de uma paisagem obliterada por uma exposição que induza a que as cores e os traços sejam exteriores ao processo criativo.

Não se procura no livro o conceito que leva o período estrutural da construção sintáctica de uma frase à mente, mas antes se procura dar uma sucessão de palavras que não precisa de ser processada no cérebro, uma imagem, obliterando completamente a capacidade criativa do autor, reduzindo a comunicação a um mundo de estímulos e sensações leves, para quê pensar? 

Recordo ter escrito cartas de amor pungentes que se estendiam por várias páginas, nunca saciado pelas palavras que dizia. Cartas de amor "ridículas", como Pessoa dizia, mas cuja beleza transcendia o riso dos que são alheios a este sentimento belo, o mais belo que o ser humano possui!

Quando recordo essas cartas, não tenho dúvida em afirmar que elas tinham origem nesse delicado sentimento; um fogo que lambia cada página e cada palavra, repetindo incessantemente a ideia de fundo plasmada em múltiplas palavras de afeição e ternura cujo objecto era a conquista do destinatário. Esse género epistolar íntimo com origem na nossa essência, no nosso fervor deambulatório, uma viagem entre a erudição e o exorcismo da paixão que alimentava um pedaço de papel.

Na verdade penso que existe uma inter-relação entre as limitações da nossa capacidade de expressão e a beleza que pretendemos transmitir, nunca saciados pelas palavras, então para quê limita-las como pretendem os minimalistas? Destruir a nossa essência, o nosso fervor deambulatório de uma viagem que de forma tão limitada (apesar de todos os recursos disponíveis), elabora o percurso entre a erudição e o exorcismo da paixão que alimentamos num pedaço de papel.

O minimalismo não iria reduzir ainda mais a criatividade desse acto de entrega que se pretende absoluto sem nunca o ser pela nossa precariedade humana? As já limitadas ferramentas de que dispomos para atingir a finalidade a que nos propomos? Ai, ai, ai... Esse sentimento belo desnutrido pela incapacidade de tecer a imaginação na moldura das nossas palavras e construções mentais.

Para combater essa visão minimalista na comunicação há que recordar aqui que os primeiros seres humanos eram na verdade os seus maiores e mais leais adeptos, pois a linguagem (já não falo na escrita) era apenas uma sucessão de grunhidos que eram canalizados através da função esfincteriana esófagica que mais não era do que um órgão originariamente destinado a suportar o processo de deglutição alimentar. Infelizmente, vejo que o panorama da literatura está a sofrer esta pressão de uma sociedade pouco virada para a cultura e mais ligada ao consumo de "hamburgers" e de "chiclete para os olhos" (TV). Este condicionamento da comunicação escrita e da linguagem é regressivo e tão primário que nos levaria e exprimir amor e afecto como o faziam os nossos mais ancestrais antepassados; Huuug, huuuu, huuuuuuug...

O que pensa disto? Quando escrevemos num acto de paixão e amor, temos a tendência de ir ao extremo na plenitude do uso das ferramentas disponíveis para exprimirmos da forma mais perfeita, mais imaculada que encontramos, esse belo sentimento que modifica a alma humana e a que de modo tão simples chamamos: AMOR!

A escrita é sobretudo uma criação do ser que utiliza uma ferramenta projectada pela ciência e destinada a dar fixidez à palavra falada conservando-a no tempo. Escritor é o ser que domina o uso desta ferramenta com estado de consciência da sua existência enquanto entidade que percepciona a realidade que o rodeia.

Ser escritor é sobretudo um estado de consciência que profana a realidade com uma intencionalidade destinada a abrir luz sobre o ser.

Abraços amigos, 

Miguel Martins de Menezes
(Adaptado de textos do autor)

terça-feira, 9 de outubro de 2012

"Relatividade" / Prosa poética


Pensamentos / Miguel Martins de Menezes


Poema de Miguel Martins de Menezes / Corpo de Mulher


Dia do Poeta / 4 de Outubro de 2012


A Religião e os Homens / "O Templo dos Homens"


Antonio Lazaro de Almeida Prado - Nota Biográfica




Caros leitores e amigos,

O ilustre Poeta e Escritor António Lázaro de Almeida Prado Vai lançar em breve mais uma das suas obras de poesia que aqui oportunamente será anunciada e divulgada.

Tive o raro privilégio de ter conhecido Antonio Lázaro por o
casião da sua passagem por Coimbra após uma cerimónia de homenagem ocorrida este ano (2012) na cidade de Aveiro.

Acabo de receber a noticia de que este ilustre poeta me concedeu o raro privilégio de comentar a sua próxima obra, o que não apenas me honra e me deixa feliz, mas também considero uma proclamação ao raro privilégio da sua amizade e das saudades que me deixou como ser humano nobre, pensador, escritor e poeta de renome.

Miguel Martins de Menezes

Peça Teatro - Le Diable Rouge / Antoine Rault:






Colbert: - Para arranjar dinheiro, há um momento em que enganar o contribuinte já não é possível. Eu gostaria, Senhor Superintendente, que me explicasse como é possível continuar a gastar quando já se está endividado até ao pescoço...

Mazarino - Um simples mortal, claro, quando está coberto de dívidas, vai parar à prisão. Mas o Estado... é diferente! Não se pode mandar o Estado para a prisão. Então, ele continua a endividar-se... Todos os Estados o fazem!

Colbert: - Ah, sim? Mas como faremos isso, se já criámos todos os impostos imagináveis?

Mazarino - Criando outros.

Colbert: - Mas já não podemos lançar mais impostos sobre os pobres.

Mazarino - Sim, é impossível.

Colbert - E sobre os ricos?

Mazarino - Sobre os ricos também não. Eles parariam de gastar. E um rico que gasta faz viver centenas de pobres.

Colbert - Então como faremos?

Mazarino - Colbert! Tu pensas como um queijo, um penico de doente! Há uma quantidade enorme de pessoas entre os ricos e os pobres: as que trabalham sonhando enriquecer, e temendo empobrecer. É sobre essas que devemos lançar mais impostos, cada vez mais, sempre mais! Quanto mais lhes tirarmos, mais elas trabalharão para compensar o que lhes tiramos. Formam um reservatório inesgotável. É a classe média!"